quarta-feira, maio 24, 2006

... é mera coincidência! (1)

Ele cambaleia, tonto. Só acordará ao sair de casa, o vento gelado batendo-lhe nas faces. Toma um banho, se arruma. Toma o café “negro como a noite e quente como o inferno”, junto com um pão-com-manteiga. Pede à mãe mais uma canoa. “humpf!” é a resposta.

Olha para o relógio e quase cospe o café. “Merda!” pensa consigo mesmo – “Perdi a hora de novo. Bosta...”. Levanta-se apressado; o beijo a mãe pega no ar, murmurando ao mesmo um “vai com Deus!”. No ponto a massa se aglomera. Passa um ônibus que mal fecha as portas. Ainda assim alguns forçam a subida. Resolve esperar outro.

O próximo passa tão lotado que têm gente na porta. “Será que eu tomei a vacina de febre aftosa?” – pensa cínico. Afinal, é o que alguém no departamento de transportes acha que somos. Gado, pura e simplesmente. Finalmente pega o terceiro ônibus, “atrapalhando” junto da catraca. Melhor que um coitado que sem ter onde ficar esperou no corredor e quase foi acusado de assédio quando uma senhora rotunda não conseguiu passar. Descendo no ponto final, ele se apressa em entrar no trem. Resolve pegar em sentido contrário, para poder ir sentado. Consegue, não sem dificuldades o lugar que merecia. Duas estações (e uma centena de pessoas) depois, uma senhora de bengala se aproxima de seu lugar. Ele olha para os assentos reservados. Todos fingem estar dormindo! Praguejando baixinho cede o lugar, e descobre que por mais que parecesse impossível entra mais gente no trem.

Começa a imaginar como uma sardinha se sente. Ou se sentiria; afinal estão mortas, há para elas ainda o sustentáculo do amor-próprio. Já para nós... Bem somos como sardinhas “Coqueiro, por favor! Se sou uma sardinha pelo menos sou uma de marca” – lembra-se de ouvir um amigo dizer. “Maldito!” – diz baixinho, com um sorriso no rosto, e imediatamente três homens próximos olham para ele, de cara fechada. Ele baixa os olhos envergonhados.

Finalmente chega, três estações depois. Ao pôr o pé pra fora, pisa em algo que algum bêbado deixou; nem pragueja, afinal ainda há chances de chegar no horário. Correndo, quase sendo atropelado, ele miraculosamente bate o ponto um minuto antes. Na sua baia espera seu chefe, de cara fechada, a baia parecendo mesmo o que o nome supõe, especialmente com aquele ser bovino ali. “Ah!, bom o senhor ter chegado!” – diz com a cara mais cínica, como se ele estivesse atrasado. “Vem comigo, que tem umas demandas pra você me entregar até as dez!”.

Ele suspira e o acompanha. Vai ser um longo dia...

1 Opiniões:

Anonymous Anônimo sacaneou...

Olha o merchâ...
Seu pseudo-comunista de meia tigela...

08:42  

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